UMA NOVA ETAPA
A preocupação agora era sobre minha mãe.
Sempre foram tão unidos, tão cúmplices, e agora? Não sabia como encará-la. O
que dizer, como dizer?
Para minha surpresa, não foi preciso dizer
nada. Ainda não sei o que aconteceu, mas, ela agiu naturalmente. O olhar mudou
bastante. Alguma coisa ela me dizia com os olhos que também me acalmava. No
nosso silêncio, nos entendemos bem. Deus foi muito generoso com a gente. Não
houve traumas.
Agora começava outra vida. Sem ele, mas com as
lembranças, com as sensações e com novidades.
Documentação, burocracias, prazos. Tudo para
resolver. E tudo foi se resolvendo.
A burocracia de dar entrada na pensão da minha
mãe, as dificuldades encontradas, compreensíveis, mas, trabalhosas. E, mais uma
vez, eu sozinho para cuidar de tudo. Em quatro meses, quase tudo estava
resolvido. Foi bem complicado.
A vida tomando formato: a nova rotina de
afazeres e sentimentos já estava acontecendo.
Minha mãe, apesar da reação favorável, ou
melhor, da não reação, teve uma mudança: ficou mais parada, menos atenta e mais
distante. Continuava interagindo, mas, bem menos.
Iniciou tratamento com fonoaudióloga, pois, precisava
manter a deglutição. Com a idade e o problema de demência, o idoso vai ficando
mais disperso, por isso tem que estimular a deglutição e a atenção. É como
esquecesse de engolir. Junto com isso, a musculatura da garganta vai ficando
flácida, o que favorece os engasgos, às vezes o alimento não desce pelo esôfago
e, sim, pela laringe, causando diversos problemas pulmonares.
A fisioterapia foi intensificada. Minha mãe se
acomodou mais, passou a não querer mais andar e fazer “corpo mole” e isso é
altamente prejudicial.
Nos meses seguintes, a situação foi se
acomodando. Nada voltou a ser como era antes, em momento algum. A vida mudou, a
realidade mudou, e, com isso, o comportamento e a dinâmica, também. A nova
rotina foi instalada.
A MINHA NOVA ETAPA
Depois de tanto sufoco, tanta novidade, tanta
tristeza, tantas incertezas, a vida não estava ideal, mas estava de acordo com
a situação: meu pai já tinha ido, minha mãe fazendo o acompanhamento necessário
(fisioterapia, fonoaudióloga, alimentação, acompanhamento médico, etc). A parte
burocrática praticamente resolvida (só ficou uma pendência a resolver que a
procuração que eu tinha da minha mãe não especificava – é quando falo que tudo,
TUDO tem que estar especificado na procuração, principalmente em se tratando de
produtos bancários).
A nova etapa iniciando e verifiquei que eu não
estava bem. Minha pressão é alta, porém controlada, mas, os remédios não
estavam fazendo mais efeitos. Fui ao médico e foi prescritos mais um remédio.
Não adiantou. Voltei e alterou outro. Nada. Troquei de médico. Mudou
praticamente todo o esquema. Não houve melhora. Fiz uma bateria de exames de
todos os tipos e nenhuma alteração. Ou seja, nada justificava minha pressão tão
alterada! Já estava há quase seis meses alterando remédios, mudando esquemas,
trocando de médico. Acho que a preocupação piorava ainda mais.
Depois da morte do meu pai e de resolver todas
as questões burocráticas, cheguei a um limite e isto significava que eu estava
exausto fisicamente e emocionalmente e afetou muita coisa na minha saúde e na
minha vida. Sugiro a leitura da matéria abaixo, que, apesar de não tratar
diretamente do assunto (idosos, demência, etc.), trata das consequências.
https://www.revistapazes.com/exaustao-emocional-ser-forte-a-todo-momento/?fbclid=IwAR3pJlkrnlbek_wmD3iY9DVFFVhos47DCWhhe6F0auPzBbRdrN7mzv-Bwa4
Finalmente um conhecido indicou um médico. Fui
me consultar e depois de relatar tudo e mostrar os exames, mudou drasticamente
meus remédios. Ainda bem que passei a tomar menos comprimidos. Depois de um mês,
minha pressão estava bem! Foi um misto de medicação nova, conscientização e
desespero em ficar bem, que fez com que eu procurasse mudar minha postura em
relação às situações.
Já estamos perto das festas de fim de ano.
Depois de quase um ano após o falecimento do
meu pai e algumas mudanças, a vida prosseguiu. A rotina de cuidados com a minha
mãe continuou e estamos na fase de manutenção: médicos, conversa com a fonoaudióloga,
fisioterapia etc. Durante esse período me aproximei mais ainda das hóspedes da
casa geriátrica.
AMIZADES
Uma coisa que me fez bem foi me aproximar mais
das pessoas idosas da casa. Muitas não recebem visitas e passei a dar mais
atenção além de cumprimentar na hora da chegada: agora, quando chego, cumprimento
todas, converso um pouco com as que interagem e também com os parentes. Na hora
de ir embora, me despeço de todos! Está me fazendo muito bem olhar nos olhos de
cada uma, receber um carinho, um sorriso, uma reclamação! E sempre um “vai com
Deus, meu filho”. Minha mãe parece não se importar de me “dividir” com as outras
idosas! Fica me acompanhando com olhar o tempo todo e sorrindo para mim. Quando
saio de lá, tenho me sentido muito mais leve do que antes.
Minhas amigas são muito legais! E sei que sou
muito querido por elas! Uma delas troca meu nome (inclusive já me acostumei com
meu novo nome!) e sempre diz que Nossa Senhora vai guiar meus caminhos e sempre
me dá um beijo na testa! Fico muito bobo!!!
Outra amiga sempre se preocupa com eu bem
estar e da minha mãe e gota muito dela. Está sempre por perto contando como foi
o dia da minha mãe. Tem uma que é muito vaidosa, outra que gosta de fazer
bordados e ouvir rádio, e tem também a jornalista, ela sabe de tudo, conta tudo
nos mínimos detalhes. É uma pessoa muito querida e me divirto quando converso com
elas. E tem muitas outras com suas histórias e histórias de vida. É muito
enriquecedor.
O corpo clínico é formado por pessoas muito
boas e pacientes. Dá para perceber o carinho que tem com os idosos, atenção o
tempo todo e sempre muito dedicadas aos parentes também: tiram dúvidas,
explicam, acompanham e dão dicas. A certeza que tenho que os cuidados são bons
é assim: nenhum paciente reclama ou trata mal quem quer que seja. Isso prova
que são bem tratados.