Mais amor, mais proximidade


MAIS PRÓXIMOS
Hoje em dia eu me sinto mais próximo dos meus pais e sei que eles também se sentem assim. Antes era sempre a correria de providenciar alimentação, exames, fraldas, consultas, cuidar da administração da casa e das pessoas que “cuidavam” deles e não sobrava tempo nem condições de ficar mais perto, de olhar melhor para eles, de tentar conversar. A cada dia que acabava eu me sentia abatido e cansado, quando estava na minha casa e telefonava para saber deles, eles não tinham condições nem de falar ao telefone, além disso tudo, trabalhando o dia inteiro e o tempo que sobrava era para resolver problemas e não para poder ficar mais próximo deles.
Hoje eles são medicados e cuidados por pessoas que sabem lidar com idosos. A alimentação e medicamentos são controlados pela casa e sei que tem sempre alguém perto deles. Isso faz uma diferença muito grande. Claro que a preocupação continua e ainda tenho afazeres como comprar os remédios, cuidar das roupas, etc, mas, agora, o tempo que estou junto deles é real, é um tempo com qualidade, onde posso olhá-los nos olhos, conversar, fazer um carinho e recebo a retribuição com o mesmo carinho que dou a eles. Faço uma massagem, um elogio, uma brincadeira. Converso, explico as coisas. Resumindo: fico REALMENTE com eles e antes, não. Não tinha tempo nem cabeça para parar e conversar, fazer um agrado, até porque eles também não estavam em condições de perceber isso.
Tanto no horário de visita ou não, o tempo é mais bem aproveitado, enfim, temos mais qualidade, estou ali só para eles. Observo e entendo o que está acontecendo com eles.
Tenho procurado cuidar mais de mim também, pois, depois de tanto problema, “apedrejamento” e correria, ganhei uma estafa e uma ansiedade crônica e tenho que estar bem para eles.
Mesmo quando eles não estão muito bem ou confusos, e tem dias que são assim, eu estou lá para segurar na mão deles com tempo e qualidade.
É a outra parte do meu papel de filho que tenho podido finalmente fazer, no mais não sou médico, nutricionista nem enfermeiro, pois, esta parte está sendo cumprida e muito bem cumprida pelos profissionais da casa.
Minha mãe voltou ao peso normal – estava quase obesa a ponto de não andar direito e meu pai não fica mais largado dormindo em um sofá, ele conversa, se comunica e está mais esperto assim como minha mãe. Estão com uma qualidade de vida que não tinham antes.
Estamos mais próximos.

ASSIM COMO NÓS
Assim como nós, meus pais também têm seus altos e baixos. Mesmo acompanhando e observando, às vezes fico me perguntando como pode ser assim. Na maioria das vezes estão espertos mas em alguns dias ou momentos, ficam muito alheios.
Conversando com um conhecido que o pai passa pela mesma situação, ele me disse da questão da comida. O pai dele acaba de comer e pede mais, como se não tivesse se alimentado. E se der, come! E pede de novo. Reparei isso no meu pai também. Quem não está acostumado, acha que ele realmente está com fome, que não está sendo alimentado, mas, não. Pergunto por que será que acontece isso, por que a demência proporciona esse tipo de sensação de fome. Mesmo que esqueça que tenha comido, como fica o estômago, se já está cheio? Por outro lado tem pacientes que não lembram de se alimentar, não sentem fome. São perguntas sem resposta, pelo menos para mim ou por enquanto.
Quem acompanha um idoso acaba tendo outro olhar. Como falei antes, estou mais próximo e posso entender um pouco, pelo menos, a dinâmica deles. Quem não acompanha, sempre duvida e julga alguma coisa.

JULGAMENTOS
Procuro “ler” as pessoas e entendê-las. Livro-me dos meus julgamentos e procuro me livrar dos julgamentos dos outros.
Um dia estava em uma loja e ouvi as duas vendedoras falando do tratamento de uma filha com a mãe idosa. Falavam da impaciência dela, do tom elevado de voz e do mau humor. Entrei na conversa para entender e me disseram que a idosa era lúcida mais que a filha não tinha o menor cuidado com ela. Claro que nada justifica maus tratos ou grosseria, mas, perfeitamente entendo a falta de paciência, ainda mais no começo quando não sabemos exatamente o que está acontecendo.
Para os outros, o idoso pode estar lúcido, mas se a pessoa não conhece, não sabia como era antes, fica difícil dizer se está lúcido ou não. Muitas atitudes chegam a ser perigosas e quem acompanha, seja filho, neto, cônjuge, fica muito difícil de entender de imediato. É muito rápido: de uma hora para outra o idoso muda de comportamento. Primeiro com gestos isolados onde chega até a ser engraçado, mas a coisa vai aumentando e quando percebemos está meio fora de controle e faz com que a pessoa que está junto fique desnorteada, estressada. Entendo a impaciência, pois, com todos os problemas do dia a dia ainda aparece mais uma situação sem explicação.
Repito que nada justifica a grosseria e/ou maus tratos. Por isso que quando perceber que alguma coisa está fora do “normal”, procure um geriatra, um neurologista. Antes, temos que entender o processo que o idoso está passando e depois, temos que cuidar de nós também, manter o equilíbrio emocional e psicológico. Não é fácil lidar com a “perda” da pessoa que está demenciando e com as consequências disso.
Temos que ter paciência, se tratar e se cuidar também. E se encontrar alguém com algum idoso e um familiar em tal situação, não julgue. Ajude.