2015. FELIZ (?) ANO NOVO
As coisas não
mudaram muito no começo de janeiro.
Não tinha como
deixá-los sozinhos e as pessoas que os acompanhavam às vezes faltavam por algum
compromisso, idas ao médico ou por motivo de doença e eu tinha que deixar meu
trabalho para ficar com eles sem deixar de cumprir minha rotina de obrigações
diárias.
Minha mãe estava na
mesma situação e meu pai tinha apresentado uma melhora em relação ao joelho:
fazia fisioterapia e já andava sozinho. Depois da cirurgia da uretra e da
retirada da sonda ele ficou melhor. Ele queria ir para a rua, sair sozinho,
mas, por ordens médicas, não podia. Ele também não aceitava em ir com outra
pessoa, não queria que percebessem que estava “dependente” ou doente e isto fez
com que ficasse mais e mais triste.
Nenhum dos dois se
interessavam por televisão, jornal, jogo ou, internet. Estavam cada vez mais
entregues aos seus sintomas e eu não conseguia mudar isto.
Meu tio aparecia
raramente e em nada ajudava. Um tempo depois a família que ficava nos finais de
semana parou de ir, ou seja, quem mais deu força e criou a situação toda para
ter uma “recuperação” em casa, pulou fora. Uma vez me perguntaram como eu fazia
quando dormia lá, porque eles não aguentavam mais o movimento deles a noite e
chegaram a se trancar no quarto para poderem dormir melhor, ou seja, era se
como estivessem sozinhos em casa.
Com a saída deles, a
acompanhante que ficava na parte da noite passou a ficar finais de semana
também.
Em janeiro meu pai
pediu para ir ao médico duas vezes e a cada consulta pedia um remédio
diferente: calmante a antidepressivo. Em um mês ele já havia mudado três vezes
de remédios. Em fevereiro ele começou a ficar mais parado, dormir muito. Não
queria reagir nem sair de casa. Reclamava. Começou a estranhar a casa,
falar coisas sem nexo, ver coisas que não existiam. Estava desorientando muito.
Das poucas vezes que
minha mãe saía com a amiga dela, caía na rua devido ao peso: ela engordou muito
em pouco tempo devido aos doces que eram servidos como refeições. Foi cogitada
a hipótese de ela estar com algum problema de joelho, mas a médica disse que o
problema era de sobrepeso já estava muito gorda.
A casa tinha mal
cheiro devido as fraldas que não eram trocadas no tempo certo e a falta de
limpeza adequada.
Além disto eu
comecei a perceber que convivia com pessoas erradas, falsos colaboradores,
curiosos, a culpa e a dúvida.
Percebi também que
eles passaram a ficar sozinhos várias vezes na troca de turno das pessoas que
lá ficavam. Uma saía antes de a outra chegar e dois idosos na condição que eles
estavam não podiam ficar sozinhos. Elas nada me diziam, apenas falavam entre si
e quando uma dizia que estava “perto” a outra ia embora e vice-versa. E eu não
sabia disso, achava que uma só saía quando a outra chegava. Certa vez me
ligaram dizendo que meu pai não abria a porta. Meio sem entender, corri para
lá. Com a minha chave, abri a porta. Meu pai estava sentado na cama e minha mãe
dormindo. Perguntei o que houve e ele disse que não queria abrir a porta. Eu
passei muito mal de nervoso, ao mesmo tempo que agradecia por nada ter
acontecido, estava muito pilhado porque poderia ter acontecido! A verdade é que
meu pai não queria deixar a chave com elas, então ele abria a porta para uma
sair e para a outra entrar. E nesse meio tempo, ficavam sozinhos. Passou a ser
perigoso deixá-los a sós com toda a vulnerabilidade possível. Só de imaginar eu
ficava muito apreensivo. Ele não queria deixar a chave com elas. Praticamente passei
a ir antes e depois do trabalho na casa deles para ver se estava tudo bem.
Muitas vezes, eles estavam sós. Presenciei gás aberto, fraldas sujas, meu pai
com fome chorando... eu me desesperava sem saber o que fazer.
Quando eu não podia ir ficava
monitorando pelo telefone para distrair meu pai (que só ele que falava no
telefone) e assim evitar que se levantasse ou permitisse minha mãe de fazer
algo errado. Com os telefonemas (que eu dava de 20 em 20 minutos), peguei
mentiras das pessoas que ficavam lá: diziam que tinham chegado em determinada
hora e eu sabia que não, pois, ou tinha estado lá ou tinha ligado e sabia dos
horários pelo meu pai. Comecei a ficar mais preocupado ainda e sabia que tinha
que mudar aquela situação e a única maneira, a correta, era deixá-los com
pessoas capacitadas para cuidados de idosos.
Passei a pesquisar valores de
empresas de cuidadores e fui percebendo que não era muito fácil nem barato:
cuidadores não fazem trabalhos domésticos, ou seja, eles só cuidam do idoso
dando os remédios na hora certa, dando banho, trocando fraldas e coisas do
tipo, mas não fazem comida nem cuidam da casa. Claro. Já diaristas só
cuidam da casa. Logo, eu teria que arrumar uma equipe das duas categorias, o
que sairia caro demais e continuaria na mesma situação e além disso teria o
gasto com as despesas da casa. E para mantê-los em casa na situação que estavam
chegando só com cuidados específicos de profissionais específicos e isto
sairia, para nós, um valor impossível de se pagar, afinal, além do normal
(salário, alimentação e transporte), teria férias, contratar outras pessoas
para cobrirem férias. Não tinha como manter nem administrar isso.
Com a situação caótica em
casa voltei a procurar casas de repouso, dessa vez determinado a encontrar um
lugar apropriado, pois, sabia que não estavam sendo tratados como deveriam em
casa. Já era uma questão de saúde e segurança também.
Fui conhecendo lugares,
pessoas, médicos e demais profissionais da área. Fui fazendo o correto: me
informando. É obrigatório saber como funcionam as casas, quais os serviços que
oferecem, que tipo de profissionais trabalham lá e como acontece a fase de
adaptação dos idosos. Sempre trocava ideias com todas as pessoas e procurava
obter informações mais detalhadas, além de observar muito todos os lugares e as
pessoas com quem eu conversava.
Visitei um lugar filantrópico
muito conhecido para tentar uma vaga, pois, teria a certeza de adaptação deles
e meu pai já tinha dito que gostaria de ir para lá. Infelizmente não tinha
vagas mesmo colaborando. Sugeri que o valor que pagaria em outra instituição,
converteria em donativos para lá, já que a proposta e o atendimento eram
maravilhosos, mas, não consegui.
E assim fui conhecendo
algumas casas, ou indicadas por alguém ou após ver pela internet. Cada uma com
sua particularidade, preços bem diferenciados e muita coisa para pensar. Fui a
Jacarepaguá, Meier, Santa Tereza, Tijuca, Cachambi e Lins. Conheci mais de 10
casas. Das que fui tive boas impressões assim como péssimas impressões.
Minhas reações eram as mais diferentes, desde tristeza profunda até a
consciência de estar fazendo a coisa certa. O que pude observar?
1 – Antes de tudo, eu não sabia que
existiam tantas casas para idosos em vários bairros e dos mais diversos.
Visitei uma média de doze e, pois, procurava em determinada região, desde
clínicas, casas de repouso e hotéis para idosos. Cada denominação tem um
significado e atinge um público diferente, abrangendo o que se quer de um
espaço assim como das necessidades do idoso.
2 – A quantidade de idosos que moram
nesses locais é impressionante. Várias casas que fui ou liguei não tinham mais
vagas!
3 – Nem todas vinculadas à religião
fazem exigências religiosas.
4 – Tanto em lugares caros quanto em
lugares mais em conta, observei abandono por parte da família e dos profissionais
que lá trabalhavam.
5 – Tanto em lugares caros quanto em
lugares mais em conta, observei ótimo tratamento por parte da família e dos
profissionais que lá trabalhavam.
6 – Entendi depois de conversar com um
médico de uma das casas o porquê de que em alguns
lugares, os idosos serem tão calmos e quietos: simplesmente são dopados.
7 – Um outro médico, de outro lugar,
indiretamente me disse como fazia para “acalmar” pacientes.
8 – Em alguns lugares, não
todos, mesmo os mais caros, a higiene e limpeza não eram das melhores.
9 – Lugares com preços exorbitantes,
sem nada que justificasse. Em outros a justificativa era uma casa bonita, com
um belo jardim, porém os idosos não usufruíam por estarem “descansando”.
10 – Pude ver lugares muito bons e
ótimos profissionais atuando com humanidade e carinho sem deixar o
profissionalismo de lado.
Conclusão:
1 – A observação é a melhor coisa: ver como estão os idosos, como é o
relacionamento deles com as pessoas que trabalham nas casas e se os
responsáveis das casas tratam o hóspede como uma pessoa que vai morar lá ou
como mais um paciente.
2 – Não se pode tirar conclusões
precipitadas. Antes de qualquer opinião tem que entender qual é o tipo de
atendimento proposto e qual o tipo de hóspede da casa.
Hoje tenho certeza do grande
equívoco que cometi em ouvir pessoas que nada sabiam a respeito de cuidados de
idosos. Gostavam de dar palpites, mas nada faziam efetivamente e, além disso,
tinham os “interessados” em mantê-los em casa. Vou repetir sempre isto.
Respeito quem tem opinião diferente da minha e quero ser respeitado também, mas
eu era julgado. E eu deveria ter seguido minha intuição.