Detalhes do dia a dia


MEMÓRIAS (?)
Mais uma visita. Hoje minha mãe perguntou por minha avó e por minha tia. Ambas falecidas. Perguntou, também, pela outra irmã que suponho ainda estar viva (não tenho tido mais contato). O que responder?
Lembro de uma sugestão que me deram e que devo ter escrito aqui: não vale a pena tentar convencê-los das coisas que eles acham que é verdade. É muito mais fácil entrarmos no mundo deles do que tentar trazê-los para o nosso. E é isto que tenho feito e que tem surtido efeito quanto às reações e “entendimentos”.
Respondi a minha mãe que minha tia estava muito gripada e que minha avó estava em casa cuidando dela, afinal não sei como seria a reação dela em saber (de novo) que elas já tinham falecido. Ela também perguntou como estava minha avó depois do tombo. Falei que estava bem e não entrei em detalhes, pois, pode ter sido um sonho ou alguma lembrança que tenha voltado.
Acabei me lembrando da minha tia e da minha avó. Nesses meses tão confusos, tenho vivido mais preocupações que esqueço das boas lembranças do passado e que vieram à tona graças as lembranças da minha mãe!!

DIA ESPECIAL
Hoje foi um dia especial mesmo com o frio que estava fazendo. Foi festa de aniversariantes do mês. Meus pais estavam bem dispostos e alegres. Conversaram, se comunicaram e interagiram. Meu pai gosta muito de bolo de aniversário e sempre come muito e nos divertimos enquanto ele comia e eu brincava com minha mãe, dando bolo para os dois. E rimos bastante! Brinquei de aviãozinho com o bolo e minha mãe, que não liga para bolo, acabou comendo bastante. Viraram crianças!
Veio à minha mente como teria sido em casa: um dia frio, a casa vazia, só nós três. Sem festa nem bolo. Como era antes. Agora, eles têm se distraído bem.

APARELHO DE SURDEZ
Desde que começou o processo de demência na minha mãe, ela passou a rejeitar o uso do aparelho de surdez. O comprometimento era de mais de 80% nos dois ouvidos. Primeiro não quis mais usar o aparelho do lado direito, em casa mesmo. Não colocava e quando lembrávamos ela colocava e depois tirava. Toda manutenção e todas consultas com otorrino estavam em dia, logo, não era algum mal-estar causado pelo problema.
Na casa geriátrica, em pouco tempo, não quis mais usar o outro. Quando percebíamos ela havia tirado e escondia dentro da fronha ou embaixo do colchão. Tentamos de tudo para que ela usasse, até que achamos melhor não insistir mais, pelo menos durante um tempo.
Com as atividades com a psicóloga ela passou a interagir mais, a ficar mais comunicativa. Achei que era a hora de tentar. Conversei com a psicóloga e com a geriatra que sugeriram conversar com uma fonoaudióloga a respeito.
Procurei a fono que disse ser interessante tentar. Foi feita uma visita e testes no aparelho onde foi identificada necessidade de um aparelho mais moderno. Fizemos um acordo e aluguei os aparelhos para fazermos o teste. Foi uma péssima ideia.
Nas primeiras horas ficou tudo bem, minha mãe estava escutando e aparentemente estava satisfeita. Percebi um certo nervosismo, conforme já falei, com o tempo a gente passa a “ler” melhor os idosos, principalmente os nossos. Achei que ela estava assim devido ao fato de estar voltando a escutar e que seria uma adaptação rápida, pois, o uso seria gradativo, a cada dia ia aumentando as horas de uso até se readaptar.
No segundo dia não quis mais usar o do lado direito, tal como fez em casa. À noite ficou totalmente nervosa, como se tivesse com algum tipo de perturbação mental. Entrei em contato com a fono que disse que não conhecia esse tipo de reação, que era para ser observada.
No terceiro dia foi caótico: ela descompensou, chegando a ficar meio agressiva. Chorava muito sem saber o porquê e estava confusa. Mais uma vez falei com a fono e foi decidido que retirasse o aparelho. No dia seguinte, apesar de mais calma, ainda estava nervosa e agitada, quadro que foi atenuando gradativamente. Duas semanas passaram até que voltasse ao estado de tranquilidade que estava antes.
Conversando com profissionais da área de saúde (psicóloga, fono), fiquei sabendo que geralmente os idosos não aceitam mais o uso de aparelho de surdez, é uma atitude comum. Não consegui entender o porquê nem sei se alguém sabe.
Fiz a minha parte, uma tentativa de melhorar o estado geral. Agora minha mãe continua se comunicando como estava antes, ela lê lábios e entende o que falamos e também consegue falar, não com a mesma desenvoltura que antes, mas a comunicação se restabeleceu.
Mais uma informação importante de saber a respeito de idosos: além de não aceitarem mais aparelhos de surdez nem sempre pode ser uma boa ideia insistir em algumas situações.

MAIS UMA AULA COM UM MÉDICO
O médico da casa faz o acompanhamento dos idosos e sempre fico interessado em saber como estão. Os exames são periódicos e quando há alguma mudança no estado clínico são feitos exames complementares.
Meu pai andou meio desanimado, mais sonolento. Levamos ao hospital e foi verificado uma anemia, que na verdade, ele já tinha há algum tempo, que chamam de anemia do idoso. Devido à idade, o organismo absorve menos nutrientes. Conversei muito com a médica que passou novos exames e suplementação.
Na casa geriátrica, uns dez dias depois, conversei com o médico a respeito dos exames. De maneira muito clara e didática ele foi me explicando das situações que geralmente ocorrem, como a anemia, por exemplo. Descartadas as doenças graves, o uso de suplementação alimentar e vitamina B12 melhoram muito o quadro. São detalhes que devem ser acompanhados. Em casa não sei se teriam este cuidado, pois, no caso de muito sono ou desatenção do idoso, seria atribuído, provavelmente, à idade e não a algum tipo de problema o que é bem perigoso. Em um lugar especializado o corpo clínico já faz a observação rotineira e em caso de suplementação, a nutricionista da casa já prepara uma dieta apropriada, situação que em casa só mesmo sendo assistido por uma equipe grande e muito bem organizada.
Conversei com o médico também a respeito do início do processo, evolução e tipos. No caso do meu pai, especificamente, em virtude de isquemias, o cérebro foi ficando com sequelas, até um momento em que os sintomas ficam mais claros e que já está em estado avançado.
E assim fomos conversando. A rapidez da doença é um fato que para mim é inexplicável, sei que cada caso é um caso, mas todos têm muita coisa em comum.
A principal lição que tenho disso é que tenho que me cuidar, fazer auto avaliações e exames periódicos. No caso de perceber em algum familiar, parente ou amigo algum sintoma ou comportamento diferente, não deixar para depois e sim investigar o mais rápido possível, até porque no início de qualquer doença a cura pode ser mais fácil ou pode se retardar a evolução.
Temos que ter humildade de ouvir opiniões dos outros e também para nos avaliar.