O Passado e o Presente

        Quando uma pessoa começa a demenciar o processo pode ser meio rápido, em um ou dois anos pode não se tratar mais do mesmo indivíduo, refiro-me ao que eram há um ou dois anos atrás. E tudo é muito pessoal: alguns ficam mais parados, sem emoções ou iniciativas; outros vão ficar mais “cheios de manias”, outros mais agressivos, outros mais confusos, outros vão repetir várias vezes as mesmas coisas e outros vão apresentar alguns destes comportamentos juntos e mais outras “manias” e atitudes, e mais um monte de comportamentos a ações distintas de cada um. Ao meu ver, isso dependerá do tipo de demência e também do tipo de gênio e comportamento que a pessoa teve durante sua vida e perante aos seus.

        Na minha convivência com meus pais, eu não tive tempo e oportunidade de observar determinadas situações durante a evolução da doença, afinal, a prioridade era cuidar do bem estar deles: alimentação, medicamentos, consultas médicas, exames, trato de higiene e tudo o que fosse preciso para manter a dignidade física e mental. Dentro desse corre-corre você  vai se “acostumando” na “nova pessoa” em que seu idoso vai se tornando, afinal, em alguns casos, não há tempo para entender que o pensamento e as atitudes vão mudando, pois, o seu tempo é para fazer com que eles estejam sempre bem.

        Pessoas que tiveram gênios difíceis, no início do processo de demência e de um modo geral, vão ser mais difíceis. A velhice não muda ninguém, nem pessoas lúcidas, ela acentua as características pessoais. Pessoas que foram dóceis podem apresentar um comportamento diferente, agressividade e até mesmo uma certa intolerância e é comum alguns idosos passarem a falar palavrões e xingar. Na minha opinião, isso pode ser da repressão que essa pessoa foi submetida na infância, na juventude ou durante toda sua vida e que, agora, não se preocupam mais com os “filtros” sociais.

       Vou frisar bem aqui que isso é a minha opinião e que não sou médico, nem psiquiatra e nem psicólogo. Sou filho. Filho de pais demenciaram ao mesmo tempo com doenças diferentes, como já citei antes.

        Voltando ao assunto, a velhice e a demência podem retirar os “filtros” de pensamento e expressão. Quando paramos e olhamos para um idoso que está totalmente diferente de quem foi, temos que pensar no passado dele. Em quem foi, nas coisas boas que fizeram e nas ruins também, e, com isso vamos aprender muito: se esse idoso foi uma pessoa boa, temos que ter essa lembrança dela, nunca devemos esquecer de nossos pais e mães mais jovens e de tudo o que nós aprendemos com eles e o que fizeram por nós. A tendência é infantilizar os idosos e, realmente, eles passam a ser um pouco crianças pela dependência, mas não vamos deixar que se apague o talento, a inteligência, o humor, as atitudes boas e tudo mais que fizeram em suas vidas. O envelhecimento faz parte da vida, e, assim como a infância, a juventude e a vida adulta, tem suas características e da mesma maneira que as outras fases não anularam as anteriores, a velhice também não deve anular. Vamos lembrar sempre disso.

        Caso o idoso não tenha sido uma pessoa adulta das melhores, vamos dizer assim, também merece todo o carinho e atenção. Se não conseguimos descobrir o motivo de temperamento difícil e comportamentos inadequados, não vai ser depois de velhos que isso vai ser resolvido. A nossa paciência e o nosso amor deve ser maior que nós mesmos e o mais importante é que devemos aprender com isso a sermos pessoas melhores agora, afinal, também vamos envelhecer e por que vamos deixar a vida de quem vai cuidar de nós (seja familiar, filho, parente ou profissionais de saúde) pior? Por que vamos ser velhinhos chatos e inconvenientes, se podemos ser aquele velhinho gente boa e agradável? E podemos fazer isso!

        Por isso que devemos sempre nos lembrar de quem foram e que tudo tem seu valor. A vida não se resume a uma fase dela. Amor e aprendizagem nunca são demais.