Uma vez, conversando com um médico geriatra, ele me disse que não devemos nos preocupar quando a pessoa vai falecer e sim, como.
Não importa quandom afinal, todos nós vamos uma dia, é inevitável, mas, o que fazemos para termos ou proporcionarmos qualidade de vida nessa fase da vida?
Temos a mania
de querer que tudo seja eterno e nos esquecemos que um sofrimento pode durar
também. Se não queremos sofrer, não é justo que alguém que a gente ama, sofra.
Em algum
momento todos vamos terminar nossa missão e é digno que o conforto e a paz de espírito estejam presente.
É egoísmo
querer mais alguns dias de uma pessoa que está em grande sofrimento físico e mental e até mesmo
se esforçando para permanecer viva simplesmente pelo nosso bem estar, para não
nos “decepcionar” ou nos fazer sofrer. Com isso podemos estar fazendo a pessoa se
apegar mais ainda à matéria causando mais sofrimento e novos carmas, onde, muitas das vezes, nosso ente querido deseja descansar, se livrar de tanto tormento. Nossa insistência se deve por uma
simples questão de tempo: uma semana, um mês do nosso lado, pode ser uma semana ou um mês de grande sofrimento para nossa pessoa tão querida.
Quando a hora
“chegar” é preciso estar com serenidade, dignidade e conforto e não aparelhos
invasivos, sondas, monitoramento etc.
A consciência
tranquila, a sensação de dever cumprido e o amor nos garante um sentimento mais
legítimo em relação à perda, eu diria até mais verdadeiro, mas isso cabe a cada
um parar e refletir e se colocar no lugar do outro.
Segue uma
matéria que li após refletir sobre este assunto. Não acho que seja assunto polêmico, e sim, pessoal. É para pensar.
As dificuldades de médicos, familiares e pacientes
em casos de doenças irreversíveis e terminais têm gerado um debate a respeito
da melhor solução para um fim de vida digno. É a busca da capacidade de
transformar o pânico em paz. Muitas vezes, questões culturais têm prolongado o
sofrimento de pacientes no leito.
Modernas
técnicas de ressuscitação, intubação, cirurgias, aprovadas por familiares e
utilizadas por uma equipe que se vê sem alternativas, devido também à
impossibilidade jurídica, por vezes só aumentam a agonia diante da morte
inevitável do paciente. A consequência costuma ser alguns dias a mais de vida
ou um longo tempo em estado vegetativo.
A
discussão sobre o testamento vital entra nesse contexto, de acordo com o
presidente da Federação dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São
Paulo (Fehoesp), Yussif Ali Mere Jr..No documento, o paciente, bem antes de
ficar doente, já registra seu desejo de não passar por tratamentos invasivos
caso entre em um estágio de doença terminal.
E,
segundo Mere Jr., não deve ser levada em conta apenas a questão jurídica (já
que o documento ainda não é considerado uma lei) para que os médicos não o
utilizem, apesar de ser regulamentado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina)
desde 2012.
—
Há a questão jurídica, mas é muito importante superar uma questão cultural, no
sentido de que o médico não está preparado para lidar com isso. É preciso
orientação, esclarecimento, transparência, informação, para médicos, familiares
e pacientes.
Ele
explica o conceito que rege o testamento vital, baseado, antes de tudo, na
maturidade para lidar, e conversar, antecipadamente sobre a morte. Para Mere
Jr., trata-se de instrumento que faz as pessoas encararem, e muitas vezes
superarem, o tabu de falar sobre o assunto.
—
Não podemos colocar o paciente, que já não responde aos tratamentos
convencionais, na UTI e ficar fazendo tudo que nós achamos, sem ouvir a família
e, principalmente, sem saber dos desejos do paciente antes dele ter ficado
doente. Todas as vidas têm limite e precisamos conhecer esse limite.
O
medo da ausência, então, se torna a certeza da presença constante, em forma de
saudade, de legado, do orgulho pelo dever cumprido, valores até mais fortes do
que a ciência nessa busca pela vida eterna.
Culpa e recursos financeiros
Para
transformar em lei o projeto relativo ao testamento vital, a Fehoesp lançou no
fim de agosto uma pesquisa pública com o objetivo de conhecer a opinião da
população a respeito do testamento vital. Qualquer cidadão pode participar da
pesquisa, até o próximo dia 30, pelo endereço www.fehoesp360.org.br
O
clínico geral Samir Salman, superintendente de um hospital específico para
cuidados paliativos, já adianta que o brasileiro, em geral, é adepto da ideia
de prolongar a vida a qualquer custo.
Ele
destaca que, atualmente, a medicina do cuidado paliativo é mais importante do
que a da cura, principalmente em idosos com doença avançada.
—
A maioria das doenças prevalentes em idosos não têm cura, eles precisam de um
acompanhamento e cuidado para que os efeitos sejam retardados. O cuidado
paliativo não é feito só por médico, é preciso uma equipe, com psiquiatria,
assistência social, assistência espiritual, psicologia, e itens que façam o
trabalho de apoio ser completo.
Salman
afirma que tentar prolongar a vida de um ente querido é uma forma também de
lidar com a culpa e outros sentimentos, que fazem parte da realidade humana em
relação às próprias limitações. E ressalta que, paradoxalmente, os pacientes de
classes sociais mais altas são os que mais sofrem neste sentido.
—
É inegável que temos de utilizar todos os avanços, mas, ao mesmo tempo, não
podemos usar esses avanços em interesses prejudiciais. O viés financeiro
interfere no sentido de possibilitar intervenções que chamamos de obstinação
terapêutica, que prolongam a vida, sem nunca mais o paciente entrar em contato
com a família. Quem tem menos dinheiro, tem mais chances de morrer dignamente,
isso é um paradoxo.